A caravana de cinema do Revelando os Brasis – Ano V se surpreende em cada cidade. Na pequena Irineópolis, no estado de Santa Catarina, a comunidade lotou o Centro de Uso Múltiplo para assistir ao documentário “Recomendação das Almas”, do diretor José Cocharski, morador do município selecionado pela quinta edição do projeto.
Ônibus vindos de localidades mais distantes começaram a chegar no final do dia para a sessão. Quanto mais o horário do cinema se aproximava, mais pessoas desembarcavam. As trezentas cadeiras do auditório não comportaram o volume de público. Mais e mais cadeiras eram dispostas no salão para acomodar os espectadores, enquanto mais e mais moradores continuavam chegando. Famílias inteiras se espalharam pelo salão, resgatando o antigo convívio comunitário e celebrando a alegria de compartilhar bons momentos. Segundo a coordenação do projeto, 500 pessoas participaram da sessão.
Formado em Magistério e Pedagogia, o professor das séries iniciais do ensino fundamental, José Cocharski se empenhou na mobilização da comunidade para o evento. E a população prestigiou a sessão preparada para resgatar a história de um antigo costume da terra que corre o risco de ser esquecido.
Com 10.989 habitantes, o município de Irineópolis ainda preserva o gesto de fazer a oração da recomendação das almas graças ao empenho de uma família da cidade. Nas noites de Quaresma, um grupo de pessoas percorre as casas convidando os moradores do meio rural para rezarem juntos a oração integrada por oito estrofes.
Feita para abrir caminhos para a salvação das almas conduzindo-as para o céu, a reza é cantada durante a noite, principalmente, às sextas-feiras, em frente às residências onde são cravadas cruzes de cedro. Quando não as encontram, os rezadores improvisam uma cruz com madeira ou taquara. Para acompanhar as rezas cantadas é usado um instrumento rústico de madeira chamado matraca. No decorrer da oração, as luzes da casa se apagam. Ao final do ritual, os ambientes voltam a ser iluminados e o dono da casa recebe os rezadores para tomar um chimarrão.
A oração era usada pelos caboclos da Guerra do Contestado, um conflito armado ocorrido na região sul, entre outubro de 1912 e 1916, numa área rica em erva-mate e madeira, alvo de disputa territorial entre os estados de Santa Catarina e Paraná. Nesta época, por ocasião da construção da Estrada de Ferro São Paulo ao Rio Grande do Sul, o governo brasileiro doou terras para grupos ligados à ferrovia a fim de permitir a instalação de uma empresa madeireira.
Expulsos da terra, sem trabalho e sem perspectiva, os camponeses se rebelaram exaltados pelo fanatismo religioso. A guerra gerou o extermínio de mais de 20 mil pessoas entre caboclos e soldados das forças militares estaduais e federais capitaneados por grandes proprietários de terra.
“Estou emocionado! Foi um grande sucesso a apresentação do curta em Irineópolis. Não imaginava reunir tanta gente em uma quarta-feira. O local ficou pequeno! Fizemos em um lugar fechado porque havia previsão de muita chuva, que não se concretizou”, conta o professor.
Esta é a segunda participação da cidade no projeto. Durante a quarta edição, a professora Dircélia Nicoluzzi, também de Irineópolis, foi selecionada com o filme “Tamanca de Madeira”, também exibido na sessão desta última quarta-feira.
Fotos: Gustavo Louzada
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