No coração das pequenas cidades, espalhadas pelo território nacional, se encontra a alegria do convívio comunitário e das velhas amizades. Debaixo de uma noite estrelada, essa foi a atmosfera que aqueceu a equipe da rota Centro-Oeste durante a estadia em Ladário, no Mato Grosso do Sul.
O Circuito tinha como missão exibir a única história selecionada do Centro-Oeste pela quinta edição do Revelando os Brasis. De autoria do ex-ferroviário e cururueiro, Sebastião de Souza Brandão, “O Trem Fantasma e a Viola de Cocho” era a atração principal da sessão de cinema na rua. Seu Tião, como é conhecido, não cabia dentro de si de tanta alegria e orgulho por contar para a comunidade uma história vivenciada por ele e seus colegas de ferrovia quatro décadas antes.
A Rua 14 de Março fora escolhida para abrigar a telona de cinema, próximo ao mesmo lugar onde, no passado, uma sala de cinema viveu seus dias de esplendor. Apesar do tempo fechado na parte da tarde, a equipe resolveu confiar na previsão de bom tempo para a noite ladarense. A meteorologia não decepcionou. Ao final da tarde, entre as nuvens, rajadas de um azul intenso misturado ao avermelhado do pôr-do-sol carregavam um bom presságio. E não choveu. A noite até estrelou cobrindo a cidade de pequenas luzes.
Mas o grande espetáculo ainda estava por acontecer. Os moradores começaram a chegar até lotar o espaço. Mais de 600 pessoas participaram da sessão. Ex-ferroviários, amigos de Seu Tião, marcaram presença e confirmaram a história contada no filme. No ano de 1977, trabalhadores da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, ligada à Rede Ferroviária Federal, viram por várias ocasiões surgirem luzes nos trilhos, na região entre Estação Agente Inocêncio e o Posto 50, próximo a Porto Esperança. Mas o trem nunca chegou, deixando assombrado quem presenciou a repentina claridade do outro lado da linha.
A sessão trouxe as lembranças da vida dura mas cheia de bom humor e companheirismo dos tempos de trabalho na ferrovia. A história do trem se mistura a outras histórias ligadas à vida de uma comunidade que cresceu em torno dos trilhos. Por isso, a sessão também teve outra inspiração: a viola-de-cocho e o cururu. Feita de madeira, a viola-de-cocho é um instrumento musical marcante dos estados Mato Grosso do Sul e do Mato Grosso. Seu som acompanha os ritmos e danças do Pantanal, o cururu e siriri, usados para saudar os folguedos populares. O Ministério da Cultura registrou o modo de fazer a viola como patrimônio imaterial do Brasil.
Filho de cururueiro, Seu Tião dedica a sua vida a defender a cultura e a preservar a memória desta manifestação. O mestre artesão ensinou os filhos e netos a construir a viola e instrui pessoas com idade entre 18 e 29 anos a fabricar o instrumento. Para aumentar a inspiração, a sessão aconteceu no Dia Nacional da Cultura.
Emocionada com o evento, a comunidade ficou encantada com a magia do cinema no meio da rua e agradecida por eternizar suas histórias através do audiovisual.
Fotos: Gustavo Louzada
Deixe seu comentário